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Fernando Pessoa

A minha alma gira em torno da minha obra literária - boa ou má, que seja, ou possa ser. Tudo o mais tem para mim interesse secundário.

Fernando Pessoa, Cartas de Amor

«Os poetas não têm biografia. A sua obra é a sua bioagrafia. Pessoa, que duvidou sempre da realidade deste mundo, aprovaria sem vacilar que se fosse directamente aos seus poemas, esquecendo os incidentes e acidentes da sua existência terrestre. Nada na sua vida é surpreendente - nada, excepto os seus poemas. Não creio que o seu "caso" deixa de sê-lo. O seu segredo, para mais, está escrito no seu nome: Pessoa quer dizer personagem e vem de persona, máscara dos actores romanos. Máscara, personagem de ficção, ninguém: Pessoa. A sua história poderia reduzir-se à viagem entre a irrealidade da sua vida quotidiana e a realidade das suas ficções. Estas ficções são os poetas Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Ricardo Reis e, sobretudo, ele mesmo, Fernando Pessoa. Assim, não é inútil recordar os factos mais salientes da sua vida, na condição de se saber que se trata das pegadas de uma sombra. O verdadeiro Pessoa é outro.»

Octavio Paz, Fernando Pessoa, o Desconhecido de si mesmo, ed. Vega


«Custa-me imaginar que alguém possa um dia falar melhor de Fernando Pessoa que ele mesmo. pela simples razão de que foi Pessoa quem descobriu o modo de falar de si tornando-se sempre por um outro. E como os deuses lhe concederam um olhar imparcial como a neve, o retrato que nos devolve do fundo do seu próprio espelho brilha no escuro como uma lâmina.»
Eduardo Lourenço

«Desde a sua meninice, a literatura foi o pátio de recreio de Pessoa e este nunca o abandonou. Como muitos outros artistas, mas ainda mais acentuadamente, Fernando Pessoa não quis crescer. Preferiu permanecer num mundo de faz-de-conta. Ou devemos chamar-lhe antes um mundo de faz-literatura? Só imaginar, só fazer de conta, era demasiado pouco para Pessoa. Como bom artista, conduzia a sua fecunda imaginação para a criação de coisas expressivas - os seus poemas assombrosos, a sua prosa bem torneada e a sua narração heteronímica, que foi o seu maior feito poético.»
Ricardo Zenith, Fernando Pessoa, A Máscara e o Espelho, Instituto Camões

Desde criança tive a tendência para criar em meu torno um mundo fictício, de me cercar de amigos e conhecidos que nunca existiram. (Não sei, bem entendido, se realmente não existiram, ou se sou eu que não existo. Nestas coisas, como em todas, não devemos ser dogmáticos.) Desde que me conheço como sendo aquilo q que me chamo eu, me lembro de precisar mentalmente, em figura, movimentos, carácter e história, várias figuras irreais que eram para mim tão visíveis e minhas como as coisas a que chamamos, porventura abusivamente, a vida real. (...) Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, nunca, me saiu da imaginação. (...) E assim arranjei, e propaguei, vários amigos e conhecidos que nunca existiram, mas que ainda hoje, a perto de trinta anos de distância, oiço, sinto e vejo. Repito: oiço, sinto, vejo...E tenho saudades deles. (...)
Excerto de uma carta de Fedrnando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro

Se eu pudesse dedicar-me a qualquer coisa - a um ideal, a um canário, a um cão, a uma mulher, a uma investigação histórica, à solução impossível dum problemas gramatical inútil...Então, sim, talvez fosse feliz. Esses nadas seriam coisas para mim. Mas nada é coisa para mim, senão as ficções dos meus sonhos, e essas são nadas por direito próprio. Ainda quando o prazer de os sonhar, tenho a amargura de conhecer que os sonho.
Fernando Pessoa, Escritos Biográficos, Automáticos e de Reflexões Pesoal

O que há a dizer? Como falar de Pessoa? Foi um homem controverso, a meu ver. Estranho. Ora a comportar-se de uma maneira ora a comportar-se de outra. Chaga-me até mim um Pessoa com uma vida comum que se afastava dos outros e vivia solitário, apenas com os seus pensamentos e personagem fictícias. Isso é a minha opinião, mas estará proxima da verdade? Não sei...acho que nem os que conviveram de perto com Pessoa saberiam.

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